quarta-feira, 18 de março de 2020




Época Estranha.

Me sinto tipo protagonista de um filme muito mal montado, misturando sessão da tarde com um fim de mundo qualquer do cinema americano. Nos meus dias cenas de comedia romântica se misturam a cenas futurista onde um perigo eminente de uma pandemia faz parar o mundo!

Sim. Final de Ciclo. Tempos sombrios.




Não que eu não soubesse faz tempo que esse momento chegaria, eu sabia. E faz tempo, desde que meu mundo começou a se desfazer em 2013, mas, ingenuamente achei que fosse durar menos e que seria mais fácil. 👊  Não foi. Nao tá sendo. 

Cada montanha russa emocional!! ... e tem momento rapel também, quando vc solta a corda, ou a letra. 
Aprendi a me divertir nessa jornada temporal nesse planeta azul. To curtindo. 
Ja tomei umas quedas, mas vi cada por do sol! e sigo caminhando. 


Nem sempre pra frente, as vezes pro lado, torcendo pra que aquele beco vire caminho, pra que sua perna de conta do salto, ou que a união faça a força (aprendi a gostar de gente nesse caminho tb). Não se desiste da montanha no meio da escalada. Foi o que Capricornio me ensinou. 

Sempre seguir.
porque a vida sempre tem saída. as vezes pra baixo, por becos, por lugares não escolhidos, nao percorridos e por isso necessários pra gente se conhecer. 
Porque só inteiro  a gente consegue sair pro mundo.






PS:  com 3 dias de isolamento,  voltei a escrever textos.... talvez o fim do mundo seja o melhor que me tenha acontecido?



Namaste!






domingo, 24 de outubro de 2010

Semente.


Um dia na vida de uma tartaruga antiga com um casco duro, burra de sensação -impossibilitada, coitada... - encontra o Sr Esquilo Folha Seca , leve, rápido, intocável, vindo do espaço onde as coisas não tem tempo, onde o momento pede o salto, onde a vida plaina.

Nesse inesperado encontro plantam juntos uma semente.

E, já não fosse o inesperado do encontro entre uma tartaruga centenária e um esquilo voador, outra surpresa acontece. A sensação de reencontro, uma cumplicidade instantânea.

Plantam uma semente que a tartaruga trouxe, e seguem.

Mas a Tartaruga fica confusa.... ! Como pode, ela, com casca tão grossa, sentir a brisa suave do Sr folha? Como pode, ela, tartaruga antiga, perceber tal sutileza... ?

A tartaruga, pensa mais.

Pensa no casco, sempre ali - nunca tão grosso, mas sempre protetor. Lembra que o casco salvou sua vida quando ela ficou presa nas pedras. Depois pensa, que sem casco, ela não teria ficado presa; teria passado entre as pedras. Pensa então, que talvez, o casco não fosse uma necessidade dela. Que talvez o casco fosse mais um costume, desses que a gente passa sem nem perceber, que fica emprestado na vida da gente. Colado, como todo costume.

Imagina a vida sem casco.Se sente veloz, plena, leve... Como uma água viva!

“Como uma tartaruga, pensa ser uma água viva?”

Esse pensamento encerrou todos os outros.

sábado, 6 de março de 2010

Fila L

Quando entramos, não podia imaginar o que aconteceria, pelo simples fato de nem ter tentado.
A vida já me surpreendeu o suficiente para que eu tenha alguma pretensão de imaginar o que vem a seguir. Hoje, eu tento viver.
Sendo assim, simplesmente entrei.

Na noite anterior havíamos ido ao mesmo teatro, e nossos lugares ficavam na fila A. Perto, pensei. Ledo engano.
Pela primeira vez na vida , a fila A era a última do teatro!
Povos diferentes lógicas diferentes. Rimos disso.
Depois do espetáculo, concordei com a vida e achei o lugar propício, devo confessar; a peça era um Beckett, em espanhol, com uma atriz que falava bem rápido.
Dormi. Um pouco. Confesso.
Nessa noite era uma estréia da mesma companhia.

Gosto disso. De me aprofundar no que quer que seja, pessoas, lugares, histórias, descobertas.
Gosto de conhecer as várias facetas do mesmo.
A verdade está no detalhe. Eu sei.

E nessa noite, os nossos lugares eram na fila L.
Descemos as escadas e percebi que L era a primeira fila!
Lembro que me diverti com a idéia, e sentei.
Gosto de opostos.

Senti aquele frio na barriga de quando algo vai acontecer e não se sabe o quê, porquê, quando, onde ou como, e só se sente o frio e espera.
Ainda hoje, a espera me enlouquece.

Sentamos.
Ar condicionado contrastando com o calor lá fora.
Um pequeno fosso entre meu lugar e o palco, um apoio para os pés.

Eu gosto de palco. Gosto de ficar perto.
E esse era alto. Profundo.Vazio.
Dois microfones na boca de cena. O palco todo coberto de rosa...
Era assim? Para mim era.
Eu estava sentada bem embaixo de um dos microfones. O seu.

A peça começou no outro extremo do palco, no outro microfone.
Um senhor - a cara do Antunes! - bom ator, começou a falar um bom texto e rapidamente me interessei.
Momento difícil o do pudor das tetas.
A atriz que falava rápido ontem também fala rápido hoje.
A peça seguia, quando você entrou e se posicionou em cima de mim.
Dizendo assim parece poesia ou exagero, mas as primeiras filas tem disso, e foi assim.

Diego: …Cuando uno no entiende la lengua, escucha a los demás como si escuchara silencio. Y si tienes una urgencia como yo, el silencio se convierte en un zumbido, un ruido desesperante que te hace recuerdo a todo lo que hiciste mal, lo que no hiciste, tus arrepentimientos…


No meio ou em qualquer parte de outro momento, você olhou para mim.
Como eu já disse, o tempo te ensina muitas coisas e eu aprendi que, do palco, o mundo não existe assim... desse jeito real que ele aparenta.
De lá, o mundo dura duas horas, não se enxerga o lado de fora porque não há, e viver significa outra coisa.
Sendo assim, quando você me olhou senti a responsabilidade profissional e sustentei o seu olhar, te apoiei – afinal era sua estréia .

Você usava óculos, grossos, pesados, que te protegiam do mundo e falavam mais ainda daquele texto.

Diego - …Perdón. Yo tengo que resolver una situación, tengo que reunir plata y no tengo mucho tiempo. Necesito entender tu lengua, que me digas cómo funcionan las cosas y me ayudes…

Você falou para mim. Depois para frente. Depois mirou a direita. Depois para mim. Depois para trás... voltou para mim. Você já tinha uma cúmplice.

Diego: ¿Como harías para entender lo que no entiendes ni si quiera a través de las palabras?
Diego: No se. No es sólo su lengua, es un mundo totalmente distinto.

Eu entendia tudo.
Com distanciamento e identificação!
Tudo.
Eu sentia de novo o que antes não era palavra.

Vivo por esses momentos, quando tocamos a compreensão, sabe...?
Momentos tão intensamente satisfatórios quanto fugazes. Sabendo disso, eu só vivo. Me integro.

A todo momento você me “ usava de ponto”, e cada vez ficava mais natural e agradável dividir o texto com você.
Eu adivinhava o texto. Não raro, mas sempre um prazer.

Quase sempre o externo é estranho ao interno.
Estranhamente, cada vez que meus olhos encontravam os seus - encontravam? -,
não me parecia estranho.

- Diego: ¡Vela por dentro, vela por dentro! ¡Vaya estupidez! ¡No tengo tiempo para estupideces! ¡Verla por dentro! ¡Por favor! ¡Que estupidez! ¡Verla por dentro! ¡Habrase ‘visto’ tamaña estupidez! ¡Por dios!

Sempre quis conhecer as pessoas por dentro.
Saber sem rodeios o que há por trás de um sorriso ou de uma recusa.
Tenho medo de sangue, mas sempre gostei de entranhas.

Uma hora eu olhei e você estava no fundo do palco, bem longe do nosso acordo,
... e me olhando...?
Será?

Aquele friozinho congelou a minha espinha.
Cética, lembrei que do palco não se enxerga o lado de fora.
E a partir dai, o frio desapareceu.

Naquela noite.

* Trechos de peça " Transparente" de Diego Aramburo ( Gracias!)